sábado, 23 de abril de 2011

Fidelidade ao estilo ou à vitória? O dilema de Guardiola

No livro “Bases Metodológicas do Desenvolvimento dos Modelos de Treinamento”, Valeriy Lobanovskyi – lendário treinador soviético/ucraniano que dá nome ao estádio do Dínamo de Kiev e um dos mais genias estrategistas de todos os tempos – em co-autoria com Anatoliy Zelentsov afirma: “Quando falamos sobre evolução tática, a primeira coisa que vem à mente é a busca de novas ações que não permitam que o oponente se adapte ao seu estilo de jogo. Se o adversário se adapta e contra-ataca, então você precisa encontrar uma nova estratégia. Esta é a dialética do jogo.” (citação extraída do livro “Inverting the Pyramid”, de Jonathan Wilson)
O Barcelona (ainda) é o melhor time do mundo porque tem Daniel Alves, Piqué, Xavi, Iniesta e Messi e o comando elegante e inteligente de Pep Guardiola. Possui também um estilo que é referência no futebol mundial pela quase perfeita combinação de plasticidade e eficiência. 4-3-3, espírito ofensivo, posse de bola, toque refinado, pressão no campo adversário. Arte e resultados. Uma escola que é a principal marca do clube – ou “más que un club”.
Só que o Real Madrid de Mourinho, treinador que já havia superado o time catalão comandando a Internazionale na temporada passada, parece ter encontrado o contraplano ou o “antídoto”. Após o auge do espetáculo blaugrana nos 5 a 0 no Camp Nou, o técnico português estudou minuciosamente seu algoz e primeiro organizou o sistema defensivo, mostrando ao mundo que tinha aprendido a marcar o Barça com o time merengue no empate em 1 a 1 pela liga espanhola no Santiago Bernabéu.
Na final da Copa do Rei, em Mestalla, a equipe de Mourinho novamente foi organizada no combate, mas deu o passo que faltava: ousadia e objetividade com a posse de bola, especialmente no primeiro tempo e na prorrogação.
O plano em Valencia foi o mesmo de Madrid: 4-1-4-1 com forte ocupação de espaços na intermediária defensiva e um volante – primeiro Pepe, depois Xabi Alonso, para também qualificar e acalmar a saída de bola – impedindo que Messi circule na sua zona de campo preferida: entre a defesa e o meio-campo adversários. Di María volta pela esquerda acompanhando o ofensivo Daniel Alves e matando a principal saída de trás do Barça. Na defesa, laterais atentos às diagonais de Pedro e Villa, deixando a dupla de zaga praticamente na sobra. Muita presença física abafando o toque dos baixinhos talentosos, além de um jogo mental com provocações, muito contato, catimba e tensão para deixar os rivais mais cerebrais desconfortáveis.
No ataque, passes rápidos e objetivos procurando os flancos, principalmente o esquerdo com Marcelo e Di María, e muitas bolas aéreas, explorando a baixa estatura da última linha catalã. Na melhor combinação das duas estratégias ofensivas, bola roubada, tabela de Di María e Marcelo, cruzamento do argentino e linda cabeçada de Cristiano Ronaldo, que subiu mais que Adriano no lance que definiu a prorrogação e a taça que o Real não conquistava há 18 anos.

Na final da Copa do Rei, a melhor execução do 4-1-4-1 de Mourinho anulando o 4-3-3 e a proposta do Barcelona: Xabi Alonso entre as duas linhas de quatro ocupando espaços e qualificando a saída de bola, linhas compactas, defesa atenta e contra-ataques em velocidade com Cristiano Ronaldo e Di María.
Sim, o time de Guardiola se impôs à sua maneira no segundo tempo, tonteando o rival e criando oportunidades. Mas sem a naturalidade habitual. Mais uma vez, Mourinho criou um incômodo para o “modus operandi” do Barcelona. Para superar o Real e chegar à final da Liga dos Campeões em Wembley, Guardiola e seus comandados terão que seguir os ensinamentos básicos e lógicos, mas essenciais de Lobanovskyi e Zelentsov.
A questão é: há como criar espaços e concluir mais vezes à frente de Casillas com a proposta de jogo filosófica, praticamente imutável, mas que novamente encontra uma barreira arquitetada pelo melhor técnico do planeta? E ainda: vale o risco de avançar tanto as linhas e dar o contra-ataque que o time madrilenho deseja?
Guardiola se mantém fiel às seus ideais e quer o tricampeonato espanhol muito bem encaminhado e que será histórico pelo fantástico aproveitamento. Mas também sabe que cair novamente na semifinal do principal torneio continental do mundo é fracasso que pode custar a um time de exceção o lugar na história que merece.
Para a difícil empreitada, parece claro que o Barcelona precisa tentar algo diferente. Talvez uma mudança na escalação, mesmo com os problemas de reposição no elenco. Keita no meio e Iniesta na ponta-esquerda é uma opção. Ou alterar a dinâmica, com Xavi e Iniesta mais incisivos na troca de posições com Messi; Quem sabe Villa, que precisa voltar a render no ataque, enfiado trabalhando como pivô pelo centro e o craque argentino procurando os flancos, como no segundo tempo em Valencia? Ou então mais chutes de fora da área, abdicando um pouco da bola, para abrir o “ferrolho”, ou “catenaccio moderno” do Real e, com o placar aberto, voltar às intensas trocas de passes e infiltrações em diagonal.

A troca de posições entre Messi, Villa e Pedro foi uma das alternativas encontradas por Guardiola para achar brechas no 'ferrolho' merengue no segundo tempo em Valencia. Mas as infiltrações e conclusões não foram suficientes para vencer Casillas
Talvez o sempre crítico e exigente (e às vezes chato) Johan Cruyff torça o nariz, o próprio Alfredo Di Stéfano, ídolo maior do Real Madrid, silenciosamente desaprove e os mais românticos se desapontem com uma pitada de pragmatismo na receita catalã. Contudo, se nos melhores sonhos de Guardiola o Barcelona fica com os títulos, é preciso mergulhar na realidade e fugir do pesadelo da armadilha de José Mourinho.
O que o leitor faria no lugar do treinador do Barcelona? Insistiria com a maneira de jogar que deu certo até agora e encanta o mundo ou mudaria para fugir da marcação do Real? Que mudança promoveria? 
vídeo com defesa do real madri mourinho:



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