segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Van Marwijk: "O time aprendeu a ganhar"


Coach Bert van Marwijk (L) attends a training session of the Dutch national football team
(FIFA.com) Segunda-feira 22 de agosto de 2011


Ele não havia dormido um único minuto desde o desembarque no Rio de Janeiro na véspera do Sorteio Preliminar da Copa do Mundo da FIFA Brasil 2014. Mas foi um Bert van Marwijk alerta, afiado, sereno e sempre realista que recebeu a equipe do site oficial da FIFA para uma conversa no hotel em que ficou hospedado na capital carioca em julho.
O técnico da Holanda ainda não conhecia os adversários que a seleção terá de enfrentar para ganhar o direito de defender o título de vice-campeã mundial em solo brasileiro daqui a três anos. Mas o impressionante balanço holandês desde a final perdida na África do Sul justificava o encontro por si só: a Laranja Mecânica de Marwijk é uma verdadeira máquina de vitórias e está prestes a fazer história também nas eliminatórias para a Euro 2012. O segredo desse sucesso quase insolente? O FIFA.com tentou descobrir durante uma entrevista exclusiva com o comandante batavo.

FIFA.com: Há um ano você declarou que o desafio imediato da sua equipe era encontrar motivação após a derrota na decisão do Mundial em Johanesburgo. A trajetória daHolanda no período prova que o obstáculo foi superado com sucesso. Acha que subestimou a capacidade de reação do elenco?

Bert van Marwijk: Boa pergunta. Não sei se você lembra, mas apenas duas semanas depois da derrota para a Espanha tínhamos de jogar um amistoso na Ucrânia. Eu não queria jogar aquela partida. Pedimos à federação ucraniana que a adiasse, mas ela não quis. Levei uma equipe B, mas a minha cabeça não estava lá. Eu mesmo não tinha motivação, e não escondi isso. É preciso ser sempre honesto com os jogadores e nunca fingir ou maquiar os sentimentos. Você sabe, quando se sai de uma Copa do Mundo nas oitavas de final ou na fase de grupos, a vontade é de voltar a jogar rapidamente para começar outra coisa e não deixar esfriar. Quando se perde na final a quatro minutos das cobranças de pênaltis, não é o caso. Os jogadores que disputaram o Mundial também não estavam motivados, mas desde 2008 esta equipe aprendeu a ganhar o que quer que seja, com ou sem motivação. Então, sim, talvez eu tenha subestimado essa capacidade nova, a qual me deixa feliz. E depois daquela partida na Ucrânia, os rapazes voltaram aos seus clubes, a temporada recomeçou e, fisicamente, eles estavam muito melhor quando as eliminatórias tiveram início.

Holanda está invicta nas eliminatórias para a Eurocopa, com seis vitórias em seis jogos. Qual é a nova fonte de motivação da equipe?

Repeti sem parar durante a Copa do Mundo: temos uma missão. Quando vi a tranquilidade dos meus jogadores depois da vitória sobre o Brasil, a concentração deles intacta, compreendi que eles sabiam que a missão não havia terminado. Lembro que organizamos uma festinha para comemorar e todos eles me disseram "professor, ainda não terminamos". Agora, nas eliminatórias, não estamos em missão, é diferente. Os jogadores entenderam bem isso. A nossa fonte de motivação é tirar as lições daquela final perdida, capitalizar em cima dessa experiência. Tudo era novidade para os meus jogadores naquele dia, e posso garantir a você que eles aprenderam.

E quanto a você? O seu discurso e o seu método de trabalho mudaram depois da final?

Tento ser o mais claro possível com os meus jogadores. A transparência é uma linha de conduta. Quero que eles sejam capazes de entender o meu método, apoiá-lo e aplicá-lo. Para isso, é preciso ser fiel ao seu estilo, não alterá-lo em função do adversário ou do contexto do momento — senão os jogadores não acreditam mais em você e não dá para evoluir. A minha ambição é a evolução constante, ir até o fim da nossa margem de evolução no sistema e no método. Digo a eles o tempo todo que, quando se joga toda vez da mesma forma, com a mesma intensidade, a gente evolui. Caso contrário, só se pode reagir. O segredo é compreender que jamais há garantia de que ganharemos o próximo jogo. É difícil encontrar as palavras para explicar como funciona. Geralmente tenho vontade de dizer aos jornalistas que venham conosco, que nos acompanhem e vejam, observem, porque aí vão entender.

A atitude dos jogadores desde o começo das eliminatórias para a Euro 2012 foi uma surpresa para você?

A partida contra a Hungria, olhando agora, foi um grande teste psicológico. Desperdiçamos a chance de fazer 2 a 0 e de repente nos desconcentramos e perdíamos por 2 a 1. Marcamos mais dois gols e voltamos a ficar com o jogo nas mãos, mas os húngaros conseguiram empatar. Eu estava furioso, queria matá-los por terem cedido o empate. Mas eles permaneceram calmos dentro de campo, jogaram o futebol deles sem pânico e acabaram ganhando por 5 a 3. Eu continuava furioso, mas muito orgulhoso. Eles blefaram comigo. Cair na facilidade e no excesso de confiança é algo tipicamente holandês. Era esse o inimigo que eu tinha de combater desde o meu primeiro dia no cargo.

Em que momento você teve a certeza de que o elenco havia assimilado a sua mensagem?

Depois de um jogo vem outro e é preciso aprender o tempo todo. A partida contra a Noruega em Roterdã pelas eliminatórias da Copa do Mundo foi uma grande satisfação para mim. Foi a prova de que o meu discurso havia chegado ao grupo. Já estávamos classificados, mas jogamos aquela partida até o fim, sem negligência. Vencemos por 2 a 0 e compreendi que eles haviam compreendido. Existe uma diferença entre acreditar e acreditar de verdade.

O seu saldo é excepcional e até histórico desde que assumiu o comando da seleção, em meados de 2008, com uma final de Mundial e 100% de aproveitamento nas eliminatórias para África do Sul 2010 e para a Eurocopa. Você se dá conta disso tudo? Pensa sobre isso?

(Sorri) As pessoas me falam dos recordes, mas, francamente, não penso sobre isso de jeito nenhum. Eu me concentro no nosso futebol e na mentalidade dos meus jogadores. É só isso o que me interessa. O primeiro adversário desta equipe é ela mesma.

A imagem que os outros técnicos têm de você mudou desde a África do Sul?

Aprendi a conhecer melhor o Vicente del Bosque, gosto muito dele e é algo recíproco. Demos até uma entrevista juntos após a final. Também tenho muito respeito pelo Marcello Lippi, e hoje sei que ele também me respeita, o que para mim é um elogio enorme. Ele e o Del Bosque conquistaram muito mais coisas do que eu na profissão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário